“Os bebés engasgam-se a comer assim!”

“Tenho tanto medo que se engasgue…”

É o maior receio dos pais e cuidadores de bebés, quando começam a alimentação complementar. Sobretudo quando falamos em oferecer comida sólida para as suas mãos e que se alimentem sozinhos, como o que é incentivado no baby-led weaning. Mas terá fundamento este receio? 

Engasgamento e reflexo de vómito (gag-reflex)

Primeiro há que distinguir o engasgamento do reflexo de vómito (gag reflex). Estes dois mecanismos estão relacionados, mas não são a mesma coisa.

O reflexo de vómito é um mecanismo de defesa em bebés e adultos, que ajuda-os a expelir comida e a afasta-la das vias respiratórias, evitando assim o engasgamento. Caracteriza-se por movimentos da língua que ajudam a puxar a comida para fora da boca.

O engasgamento acontece quando as vias respiratórias são totalmente ou parcialmente bloqueadas. Em resposta o bebé começa a tossir, de forma a libertar as vias respiratórias. 

No que toca ao reflexo de vómito, este é comum quando o bebé começa a comer comida sólida. Enquanto num adulto precisamos de pressionar com um dedo o fundo da língua, quase tocar na garganta, para provocar o vómito, num bebé este ponto é mais sensível e mais próximo da ponta da língua. Com o crescimento do bebé, este ponto vai se tornando menos sensível e localizando-se ao fundo da língua como num adulto. Portanto, quando um bebé experiencia o reflexo de vómito (gag reflex) não quer dizer que a comida está muito próxima das vias respiratórias ou que esteja em perigo de se engasgar. 

Reflexo de vómito é uma forma de aprendizagem

Pode parecer violento pensar que um bebé que provoca o vómito está num caminho de aprendizagem. Mas é a verdade. O reflexo de vómito, para além de ser um mecanismo de defesa do bebé, que previne que se engasgue, é um momento de aprendizagem. É um momento importante para que os bebés aprendam a manipular a comida com as suas bocas, a perceber as quantidades e consistências que conseguem engolir. 

Por isso, é normal que nos primeiros dias de introdução de comida sólida (seja aos 6 meses, ou mais tarde), que estes episódios de reflexo de vómito sejam mais frequentes. No entanto, com o tempo e experiência do bebé, estes episódios desaparecem rapidamente.

Não fará sentido adiar a introdução de comida sólida,  por causa deste receio. Pois é algo que todos os bebés irão viver, seja aos 6 meses, aos 9 meses ou depois do 1 ano. É um processo de aprendizagem, pelo qual todos passam, e o adiar não vai contribuir para uma diminuição deste reflexo. Aliás, quanto mais velho for o bebé, menos sensível e perto das vias respiratórias é o ponto que desencadeia o reflexo de vómito, podendo nesses casos ser mais perigoso oferecer alimentos sólidos, a bebés inexperientes. 

Uma experiência sensorial total!

Quando um bebé está a aprender a alimentar-se sozinho, é importante que tenha uma experiência sensorial total. Ou seja, é fundamental que reconheçam os alimentos através de 4 sentidos: visão, tacto, olfacto e paladar. É através da conjugação destes 4 sentidos, que o bebé percebe o que vai comer, e o esforço que tem de investir para conseguir mastigar e engolir os alimentos de forma segura. 

Quando dizemos que os bebés só amassam a comida com as mãos, eles estão na verdade a experimentar a sua consistência e a aprender que aquele alimento, com aquela cor, aquele cheiro e aquela textura, pode ser ingerido num pedaço grande ou pequeno, que ele consiga mastigar e engolir.

Por isso é importante que seja o bebé a controlar toda esta experiência. Tocar, amassar, esfregar, cheirar, lamber, tudo faz parte do processo de aprendizagem que é comer. 

Cuidados a ter para evitar o engasgamento

Há 3 pontos chave a ter em atenção, para que os bebés se alimentem sozinhos em segurança, sem perigo de engasgamento.

Primeiro, o bebé tem que conseguir sentar-se sozinho, direito, com ou sem apoio. Esta é a posição que o bebé deve tomar para comer. Uma posição reclinada altera o ponto de gravidade e faz com que a comida vá para o fundo da boca rapidamente, sem que o bebé consiga mastigar devidamente, havendo maior risco do bebé se engasgar.

Segundo, deve ser o bebé a levar a comida à boca e não o adulto. Como referido anteriormente, os bebés que controlam o que colocam na boca, levam uma serie de informação, que não conseguem recolher, se formos nós a fazê-lo por eles. Logo ao tacto, o bebé percebe se o alimento é rijo, ou mole, se é um pedaço grande ou pequeno. Aqui percebe o esforço de mastigação, que tem de fazer, e se consegue, ou não, comer aquele alimento. Se o adulto coloca um pedaço de comida na boca do bebé, salta-se uma série de passos no processo, podendo não ser seguro para o bebé.

Terceiro, e último, a consistência dos alimentos. É verdade que os bebés não precisam de dentes para mastigar. Eles estão lá, debaixo das gengivas e fazem o seu trabalho mesmo assim. No entanto, há alimentos que não são seguros oferecer, se o bebé ainda não possuir dentição molar. Frutos secos inteiros, cenouras cruas, maçã crua (rija), entre outros alimentos, são de evitar, pois o bebé não os consegue desfazer. 

Se sentir algum tipo de insegurança em oferecer alimentos sólidos a bebés, recomendo que faça um curso de primeiros socorros. A Cruz Vermelha Portuguesa tem diversos cursos de socorrismo disponíveis, que podem ajudar.

Descubra como oferecer os alimentos ao bebé aos pedaços, com corte seguro.

 

*referência: “Baby-led Weaning: Helping your baby to love good food” por Gill Rapley e Tracey Murkett. The Random House, edição de 2008.