As papas caseiras podem ser uma opção saudável e económica, em relação às papas de pacote. Numa papa caseira há um maior controlo de açúcares adicionados, há maior variação de sabores (composição de cereais e fruta). Mas também tem inconvenientes. Há maior incerteza na sua composição nutricional, em relação a uma papa de pacote, que sabemos com precisão quantos miligramas de vitaminas e minerais tem cada colher. Também, há maior incerteza no controlo e segurança dos ingredientes, em relação a uma papa de pacote, altamente controlada. E neste momento poderão achar que estou a ser paga por uma qualquer marca de papas de pacote, para as advogar. Mas não. Tal como defendo a oferta de papas caseiras a bebés e crianças, cabe-me a responsabilidade de alertar para os possíveis perigos numa papa caseira.

Fitatos

Já expliquei em outros momentos aqui no blog, que os cereais (sementes, oleaginosas e leguminosas, já agora) possuem compostos naturais designados de fitatos. Infelizmente o nosso organismo não tem a capacidade de digerir estes fitatos. Em consequência, uma ingestão excessiva de fitatos provoca desconforto no sistema digestivo, sobretudo intestinal, para além de inibir a absorção de nutrientes naturalmente presentes nesses alimentos.

Os fitatos podem ser minimizados, ou eliminados, através do demolhar e do cozinhar. Quantos mais processos, mais fitatos conseguimos eliminar. Portanto, cereais em grão ou flocos de cereais, que são demolhados e posteriormente cozinhados, têm uma menor quantidade de fitatos, e por isso são mais digeríveis e com maior percentagem de nutrientes absorvíveis.

Quando falo em cozinhar, tanto se trata de cozer, como tostar. Uma granola, por exemplo, é uma boa forma de consumirem flocos de cereais e sementes, com crunch.

No caso dos grãos de cereais devem demolhar em média cerca de 12h, podendo demolhar mais tempo. Os flocos de cereais devem demolhar por pelo menos 2h, podendo demolhar por mais tempo. Deve-se sempre eliminar a água de demolhe e colocar nova para cozinhar os cereais.

Farinhas

As farinhas de cereais não são bons ingredientes de papas. Penso que existe uma ideia, ou cultura, que as papas são feitas de farinhas. Mas não. Uma papa são cereais cozidos. Uma papa de pacote é transformada em farinha, pois foi a forma que a industria encontrou para as pessoas “reconstruírem” a papa em casa. 

Muitas vezes as farinhas de cereais são desprovidas de partes essenciais do grão de cereal, como a casca e o gérmen, pois são de difícil moagem. Quanto mais processado e refinado for o grão, mais “despido” de nutrientes se torna. Idealmente deveríamos usar os grãos de cereais, mais ricos, mas que levam muito tempo de demolhe e cozedura. Felizmente temos os flocos integrais (grão esmagado), que apesar de processado, ainda conserva valor nutricional do grão de cereal. 

Isto não se aplica às farinhas de não-cereais, como a farinha de alfarroba, por exemplo.

Glúten

É facto que o glúten deve ser introduzido até aos 12 meses de vida do bebé, para minimizar o risco de intolerância*. Por isso, ao oferecer papas caseiras, devem ser escolhidos cereais que possuem glúten: trigo, centeio e cevada. A aveia não tem glúten naturalmente presente. Poderá ter por contaminação, mas não serve de ingrediente para introduzir o glúten! 

É por isso importante na oferta de papas a bebés, que a introdução ao glúten seja feita correctamente, com os cereais certos.

*Recomendações de Janeiro de 2017 do European Society for Paediatric Gastroenterology, Hepatology and Nutrition e da North American Society for Paediatric Gastroenterology, Hepatology and Nutrition.

Segurança dos ingredientes

Este é o ponto mais importante, que diz respeito à segurança dos ingredientes adquiridos. É importante certificar a sua origem e se no país de origem existe legislação específica de controlo de qualidade de alimentos. Porque uma coisa é inegável e nem eu posso discordar ou refutar: uma papa de pacote é muito mais segura e controlada a nível de ingredientes, que uma papa caseira. Por isso é importante haver segurança na aquisição de ingredientes. Verificar rótulos, país de origem e se houver dúvidas, contactar as marcas.

 

Senti-me na responsabilidade de deixar estes alertas em relação aos possíveis perigos numa papa caseira. Fazer papas em casa requer cuidados, conhecimento e informação. É preciso cuidados na aquisição de ingredientes, na preparação e confecção. Tal como são precisos esses cuidados na preparação de tantos outros alimentos e refeições de bebés. Uma papa caseira é saudável e um bom alimento, desde que bem confeccionada e os seus ingredientes bem preparados.