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Talvez o que leio mais nas caixas de mensagens do blog. “Comia tão bem, agora não come nada, já não sei o que fazer…”. Calma! 

Na grande maioria (raro não ser) são mães de bebés de 13-14 meses, que tiveram uma introdução da alimentação complementar exímia, mas que de repente rejeitam a sopa que comiam tão bem, o arroz que tanto gostavam e mesmo a fruta que os regalava. 

Há uns meses escrevi sobre este tema neste post, para as mães que têm dificuldade na introdução da alimentação complementar. Mas hoje venho-vos falar de uma questão que está provada e escrita: anorexia fisiológica do 2º ano de vida. Trata-se de um fenómeno pelo qual todas as crianças passam depois dos 12 meses de idade, claro que numas se nota de forma mais evidente que noutras, mas de alguma maneira passam por isso (eu tenho dois casos distintos em casa, que já vou descrever).

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Em “Crescer para Cima – Prevenção e Tratamento da Obesidade Infantil” de Carla Rêgo e Maria Antónia Peças, editora Marcador, 1ª edição.

Os primeiros 12 meses de vida de um ser humano são caracterizados por um acentuado crescimento, que não terá em mais nenhum momento da sua vida. Esse crescimento é correspondido com elevadas necessidades nutricionais que o bebé procura. Atingido esse pico por volta dos 12 meses, o crescimento desacelera, as necessidades energéticas diminuem e, por isso, o apetite também.

Para uns pais, que consideram que o seu bebé come bem, começar reparar que come menos é motivo de grande preocupação. Segundo a DGS (Saúde Infantil e Juvenil – Programa Nacional de Junho de 2012), um dos tópicos que deve ser abordado na consulta marco dos 12 meses é precisamente a anorexia fisiológica do 2º ano de vida, o que devia levar aos cuidadores da criança a estarem mais atentos e preparados para esta nova fase, pois é isso mesmo, uma fase, como vão ocorrer noutros campos do desenvolvimento infantil. 

A falta de preparação dos cuidadores (às vezes os pais, ou mesmo os avós) traz consigo vários práticas contraproducentes ao desenvolvimento da criança na temática da alimentação, como as distracções (televisão e brincadeiras na hora de refeição), “negócios” (“se comeres a sopa toda ganhas…”), substituições (comer uma papa em vez da sopa), etc. 

A hora de refeição deve ser partilhada em família, todos sentados na mesma mesa, a partilhar o “mesmo tacho” (como Mário Cordeiro retrata n’ “O Grande Livro da Criança”). Acima de tudo, o apetite da criança deve ser respeitado. É um ser como nós. Se estivéssemos com falta de apetite, ou cheios após duas colheradas, gostaríamos que nos obrigassem a comer? Ou que nos enganassem para que comamos? 

Como disse em cima, tenho dois casos distintos de anorexia fisiológica. A L. teve de forma bem marcada. Passava almoços que só comia uma colher de sopa e dizia que não ao resto. Mais uma trinca numa banana e abanava a cabeça. Na altura, na minha ingenuidade, tentava que ela comesse de qualquer maneira, pois fazia-me confusão que não comesse! Só com a explicação da pediatra perante o meu drama, relaxei e assumi que era uma fase natural. Desde que continuasse a evoluir, estivesse feliz, bem disposta e saudável, não havia motivos de preocupação. E sim, foi muitas vezes para a cama, com 3 colheres de sopa e um naco de pêra, por muito que isso me custasse. Ainda hoje com quase 4 anos é um bocadinho assim, num comportamento que o pediatra Mário Cordeiro descreve bem: 

“Um aspecto muito típico da evolução normal de algumas crianças é ter fases de grande crescimento e fases de latência, como se o crescimento se processasse em escada – no início de cada patamar, depois de ter crescido (subido o degrau), há um descanso que leva a que a criança não tenha muito apetite. Esta fase pode variar, em duração, de dois ou três dias a semanas.”

Retirado daqui

Temos dias que a L. parece rota e come tudo o que lhe aparece à frente. Outros que nem uma fatia de pão inteira consegue comer ao pequeno-almoço. 

Já a T. tem altos e baixos. Não senti uma fase tão marcada de falta de apetite como a L. Mas temos dias que os lanches são mais reforçados (e que reforçados), outros que empurra tudo e não quer nada. Jantares que são só de sopa, e nem o seu adorado arroz toca, outros que come e repete e se for preciso rouba à irmã. 

O importante é respeitar o ritmo delas, os seus apetites, as fases, o desenvolvimento. E tenham sempre em consideração: está feliz, bem disposto/a, activo/a e saudável, então é porque está tudo bem e os pais só precisam de relaxar. 🙂

Para mais informações sobre este tema, recomendo estes dois artigos:

O que é a anorexia fisiológica do 2º ano? – Hugo Rodrigues do “Pediatra para todos”.

Não come nada! – Mário Cordeiro, na Pais & Filhos