papasgluten01

Lembro-me, quando a L. tinha mais ou menos a idade da T., uma amiga com a filha da mesma idade perguntar se a L. já comia sozinha com a colher. Respondi prontamente que não, que até achava cedo para isso! A minha amiga explicou, que a pediatra lhe tinha falado nesse assunto na última consulta e que a tinha deixado preocupada. Acalmei-a, que não havia razão para isso, que todos hão-de lá chegar. 

Mas a verdade é que há uns bebés mais interessados em comer sozinhos que outros, e uns mais desembaraçados das mãos que outros. Isso não quer dizer nada. Como o pediatra Mário Cordeiro diz “não existem super bebés!” Uns são mais dotados para umas coisas, outros para outras, mas todos chegam lá, mais tarde ou mais cedo.

No entanto, e com duas filhas “no bolso”, tomei a liberdade de escrever sobre este tema. Para perceber que os bebés são mesmo todos diferentes (mesmo duas irmãs, com o mesmo pai e a mesma mãe, criadas da mesma forma), mas também para mostrar alguns passos que estimulam os bebés à sua autonomia. Com esta última frase, tenho a deixar uma ressalva importante: não acho que se deva obrigar/forçar/treinar um bebé a comer sozinho, deve-se ouvir o bebé e perceber se está preparado e interessado em fazê-lo, e sobretudo se os pais têm esse mesmo interesse (poderão existir pais que não queiram que os filhos comam sozinhos muito cedo, é uma decisão a respeitar, como outra qualquer).

A L. e a T. tiveram um desenvolvimento muito diferente no que toca a comer com a colher (e as próximas palavras só demonstram o quão diferentes são os bebés e devemos mesmo “ouvi-los” para perceber o que melhor se ajusta). A L. sempre foi muito habilidosa com as mãos. Ainda não tinha 1 ano e já conseguia folhear um livro. A T., nem por isso, agora com quase 13 meses, nem um livro de páginas grossas consegue abrir! 

Passei uma colher para a mão de ambas, quando tinham mais ou menos 9 meses, para que começassem a assimilar o objecto. Calhou mais ou menos na mesma altura. No caso da L. porque ela tinha mesmo muita destreza com as mãos, e achei que estava na altura. Com a T., porque ela insistia em pegar na colher que eu tinha na minha mão, enquanto eu lhe dava a comida. 

Não caí na ilusão que usariam correctamente. O objectivo era mesmo explorar.

colher05

colher04

Acho a maior graça que comam com uma mão e a colher na outra!

colher01

A L. demorou mais tempo a dominar a colher. Mais ou menos por volta dos 13 meses, manipulava muito mais facilmente o garfo. A colher conseguia usar em comidas mais espessas e que não escorregassem. Daí até conseguir comer a sopa sozinha, demorou largos meses.

colher03

colher02

As mãos gordinhas da T. sempre tiveram muito jeito para segurar comida. Com 5 meses segurou num pedaço de maçã e lambeu-o todo. Acabou por ser a comida que levou a T. a desenvolver a motricidade fina, a fazer pinça e a saber usar aqueles dedos rechonchudos para alguma coisa. A motivação dela é mesmo conseguir comer, da melhor forma possível. Enquanto manipulava a colher e percebia para que lado ia para onde, também percebeu que comer sopa com os dedos não a levaria longe. E um dia, sem mais nem menos, empurrou a minha mão e comeu meia taça de sopa sozinha. Simplesmente assim! Agora comemos sempre com 2 colheres, e ela lá vai preenchendo os espaços de tempo que eu demoro a encher a minha colher. 

O garfo, não está a ser tão fácil como foi com a irmã. Levar à boca está mais que dominado, espetar na comida é que ainda não apanhou o jeito, mas também acho que ainda é cedo. 

Posto isto, deixou alguns pontos que quanto a mim foram fundamentais na autonomia da L. e da T. na hora da refeição.

1. Estimular o uso das mãos na hora da refeição. Ou seja, um pouco de BLW, para que mexam, esmaguem e explorem a comida com as mãos, e percebam que são uma ferramenta importante na sua alimentação. Assim que se colocar uma colher na mão deles, e eles perceberem que é uma extensão da mão, rapidamente a começam a usar com precisão.

2. Observar o bebé com atenção, para perceber quando será a altura ideal para lhe dar a colher para a mão (ou arriscam-se a levar com a colher na cabeça, à falta de melhor uso). Perceber se já tentam ser eles a comer sozinhos, se querem pegar na vossa colher, se começam a rejeitar a comida, que tentam dar (tenho uma amiga que só conseguiu que a filha comesse, quando passou a ser a bebé a comer sozinha com menos de 12 meses). 

3. Perceber a vontade do bebé e não “perturbar” esse auto-estimulo. Vai haver comida a voar? Vai. Vai haver bebé sujo da cabeça aos pés. Vai? Não vos posso prometer uma cadeira da papa limpa, nem mesmo uma mãe limpa, depois desta etapa. Mas é isso mesmo, uma etapa, e serve para que aprendam. Se não dermos oportunidades para experimentarem e exercitarem, como esperamos que depois consigam?

4. Por fim, não desesperem, pode levar 1 ano até que aprendam a comer com a colher. Não há datas nem prazos nesta coisa dos bebés. Será, quando terá que ser, e não há nada que possamos fazer, para além de deixar as coisas naturalmente acontecerem. Só temos que “escutar” os nossos bebés, perceber o que precisam, e dar-lhes isso mesmo. 

A próxima vez que o seu bebé rejeitar uma colher vinda de si, pense se não será por ser ele a querer pegar nessa colher, e ser ele a comer sozinho.  

*título deliberadamente retirado da música infantil “Joana come a papa”.