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Quantas vezes ouvimos os nossos filhos dizerem que não gostam de determinada comida sem sequer terem provado? Ou mesmo, dizerem que não gostam, semanas depois de terem comido um prato cheio. Falo por mim, isto consome-me, sobretudo com a L. que se expressa melhor verbalmente que a T. Mas não me limitei a aceitar estes “não gostos” de ânimo leve, muito menos a estimular o “não gosto”. Comecei a pensar mais no assunto e a reflectir no porquê daquela reacção. 

Desde que a L. sabe falar (falar mesmo, não dizer algumas palavras, como está agora a T.), que levo constantemente com os “não gostos”. Acontecem em duas situações bastante distintas: ou quando ofereço algo novo, que ela nunca tenha comido, ou quando é algo que come regularmente e subitamente passa a “não gostar”. 

Hoje vou falar-vos de como lidar com a primeira situação, deixo a segunda para um segundo post, pois este tema requer atenção bem distinta.

Vamos colocar-nos no lugar deles. São pequenos, têm um leque de expressões verbais muito limitado, para comunicarem o que sentem. Através do “gosto” e “não gosto”, eles conseguem reunir uma grande quantidade de sentimentos e de os comunicar. Têm como exemplo o “gosto muito de ti”, que não cansamos de lhes dizer. Por isso, eles entendem que o gostar é um sentimento quente, confortável, agradável. Sendo a negação dessa expressão o contrário, algo desconfortável, incerto, que pode causar alguma tensão ou nervosismo. 

Posto isto, vamos tentar perceber o que esta pequenada sente, quando lhe colocamos uma comidinha nova à frente. É novo, é desafiante, é inseguro, tenho medo… “não gosto!” dizem eles, quando na verdade, se tivessem vocabulário para isso, diriam “não me sinto preparado para comer isso ainda“. Vamos imaginar que estamos num qualquer mercado chinês, virados para uma barraca de insectos fritos no espeto. Hmmm… oferecem um para provarmos. Não podemos dizer que não gostamos, porque nunca provámos, provavelmente vamos dizer que não estamos preparados para experimentar e que precisamos de algum tempo para interiorizar a ideia de comer algo que está fora da nossa zona de conforto.

Pois é isso mesmo que temos de fazer com os nossos pequenos. Respeitar as suas inseguranças no que toca a alimentos novos! É normal e até nós passamos por isso. E ajudarmos a ganharem confiança para que experimentem e comam coisas novas.

Deixo-vos algumas dicas de como ajudar os pequenos nestes momentos de tensão. 

– Em primeiro lugar é não limitar tanto esta zona de conforto deles. Ir oferecendo coisas novas constantemente, para abrir a perspectiva dos pequenos em relação à comida. É por isso que experimento coisas novas todas as semanas, para desafiar as miúdas a experimentarem pratos diferentes e não terem uma zona de conforto, no que diz respeito à comida, tão definida. Por vezes os pais tendem a “obedecer” cegamente aos “não gostos”, não procurando o verdadeiro significado da expressão. Acabam por não oferecer esse alimento, tendem a não se aventurarem a fazer coisas novas, pois nenhuma mãe empenhada em cozinhar um delicioso jantar que ouvir um “não gosto” do seu rebento. Há que contrariar esta tendência. 

Mostrar-lhes como os alimentos se transformam, desde o seu aspecto original até à forma que chegam ao prato. Esta semana fiz um jantar crudívoro e a L. mostrou-se muito reticente em provar desde início. Para ajudar a que experimentasse, mostrei-lhe todas as etapas. Dei-lhe um caju a provar, que ela gostou, transformei o caju em pasta, dei a provar novamente, e ela gostou. Experimentou o tomate seco, os pinhões, os brócolos crus, o pesto de tomate seco e gostou. Comeu a curgete crua e gostou. No final, quando o jantar estava montado no prato, não foi difícil para ela perceber as diferentes partes e comer tudo com grande satisfação. 

Oferecer pequenas porções, para que eles não se sintam pressionados a comer “tuuudo”, mas sim a provarem um bocadinho. A L. às vezes quando vê um prato cheio (por exemplo, num restaurante), diz logo que “não gosta”. O que faço é dar-lhe um prato pequeno, e vou pondo aos poucos pequenas porções de comida que ela vai petiscando e perguntando o que é. Quando damos por ela, comeu o prato cheio que tinha rejeitado ao início. 

– Por fim, mas não menos importante, respeito e paciência para com a criança, pelo seu ritmo e os seus tempos. É fundamental respeitarmos a forma orgânica como os nossos filhos crescem e se preparam para novos desafios. Para algumas crianças, a alimentação pode mesmo representar um desafio, cabe-nos enquanto cuidadores, ajuda-los a lidar com essa tensão com muita calma e sabedoria. 

Agora que a L. tem quase 4 anos, comecei a ensinar-lhe que não se diz que não se gosta, sem se ter provado. Vou-lhe sugerindo algumas alternativas de respostas entre o “não quero provar agora”, “não me sinto preparado para provar agora”, mas a que ela usa mais para se expressar é o “tenho medo de experimentar!”, que é bem mais próximo do sentimento real, do que o “não gosto”.